FED vs BC: Expectativas Divergentes sobre Juros e o Impacto dos Gastos Públicos na Economia do Brasil e EUA

O cenário econômico atual mostra uma clara divergência entre as políticas monetárias de Brasil e Estados Unidos, especialmente no que diz respeito às taxas de juros.

Nos Estados Unidos, o Federal Reserve (Fed), o banco central americano, está considerando reduzir as taxas de juros. Atualmente, os juros americanos estão entre 4,75% e 5%, e a expectativa é que o Fed promova cortes nas próximas reuniões. A principal razão para isso é o temor de uma recessão iminente. O Fed vinha subindo os juros agressivamente nos últimos anos para controlar a inflação, que havia disparado por conta de fatores como a pandemia e a guerra na Ucrânia. Agora, com a inflação finalmente desacelerando e chegando mais perto da meta de 2%, há uma preocupação crescente de que os juros elevados por muito tempo possam acabar freando demais a economia e levando o país a uma recessão.

Por outro lado, no Brasil, o cenário é bem diferente. Aqui, o Banco Central (BC) deve continuar a elevar a taxa Selic, que já está em 10,50%, com expectativa de subir para 10,75%, e pode alcançar até 11,75% até o fim do ano. Isso porque, apesar de alguns sinais de desaceleração na inflação, ainda há preocupações com a desancoragem das expectativas inflacionárias — ou seja, o mercado não acredita que a inflação vá convergir para a meta de 3% tão cedo. A economia brasileira está surpreendentemente aquecida, com o PIB subindo mais do que o esperado, e o mercado de trabalho também está forte gerando pressão inflacionária, além de o câmbio ter se desvalorizado, o que aumenta o custo de produtos importados e impacta ainda mais a inflação.

Os gastos do governo acima do que é arrecadado — ou seja, o déficit fiscal — são um fator importante que pressiona a inflação e, consequentemente, aumenta a necessidade de elevação da taxa de juros. No governo Lula, o déficit já ultrapassou R$ 1 trilhão. Esse desequilíbrio entre o que o governo gasta e o que arrecada acaba criando diversas pressões sobre a economia:

  1. Maior Emissão de Dívida Pública: Quando o governo gasta mais do que arrecada, ele precisa buscar recursos para cobrir esse déficit, e a principal forma de fazer isso é emitindo mais dívida pública. Para atrair investidores para comprar essa dívida, o governo precisa oferecer juros mais altos, o que aumenta o custo da dívida para o próprio governo e faz com que ele tenha que pagar mais para sustentar suas contas.
  2. Aumento da Demanda na Economia: O aumento dos gastos do governo, especialmente em áreas como infraestrutura, programas sociais ou mesmo na folha de pagamento, injeta mais dinheiro na economia. Isso estimula a demanda, o que, em um cenário de capacidade produtiva limitada, pode gerar pressão inflacionária, elevando o nível geral de preços.
  3. Fuga de Investimentos: Um aumento nos gastos públicos sem uma contrapartida de receita gera desconfiança nos investidores, tanto nacionais quanto estrangeiros. Eles começam a se preocupar com a sustentabilidade fiscal do país e, em consequência, podem retirar seus investimentos ou exigir retornos mais altos para continuar investindo. Isso eleva as taxas de juros que o governo precisa pagar e também pode enfraquecer a moeda local, gerando ainda mais inflação.
  4. Pressão na Política Monetária: Para combater esses efeitos inflacionários gerados pelos gastos excessivos, o Banco Central é forçado a manter uma política monetária mais restritiva, elevando a Selic. Juros mais altos são necessários para controlar a inflação, mas eles também acabam tendo efeitos colaterais indesejados, como frear o crescimento econômico e encarecer o crédito para as empresas e os consumidores.

O dilema que o Brasil enfrenta é que, por um lado, o governo federal está tentando promover crescimento econômico e reduzir a desigualdade com gastos maiores, mas, por outro lado, esses gastos desenfreados colocam em risco a credibilidade fiscal e elevam as pressões inflacionárias. O resultado é uma política monetária mais rígida do Banco Central, que precisa compensar a falta de disciplina fiscal.

Esse contexto ajuda a explicar por que, mesmo com uma inflação que parece estar temporariamente sob controle, o Banco Central está elevando os juros. A preocupação com o aumento da dívida pública e a sustentabilidade das contas do governo é um fator-chave na tomada de decisões. Se o mercado acredita que o governo não conseguirá controlar os gastos no longo prazo, as expectativas de inflação se desancoram, e o Banco Central é forçado a agir com juros mais altos para restaurar a confiança.

Razões por Trás das Decisões

A diferença nas decisões entre os dois países se deve à situação econômica de cada um. Nos EUA, a inflação já está controlada, e a prioridade agora é evitar uma recessão. O medo é que, se os juros continuarem elevados, as empresas vão parar de investir, as pessoas vão gastar menos, e isso pode resultar em uma desaceleração forte da economia, levando ao aumento do desemprego e à queda do consumo. O Fed, portanto, está mudando o foco de combater a inflação para estabilizar o crescimento.

No Brasil, porém, a inflação ainda não está totalmente controlada, e as expectativas do mercado apontam que ela pode voltar a subir nos próximos meses. O Banco Central precisa agir para garantir que a inflação volte à meta, mesmo que isso signifique segurar o crescimento econômico a curto prazo. Além disso, o Brasil enfrenta pressões políticas e fiscais, com o mercado questionando a credibilidade da política monetária, especialmente em relação à condução futura pelo novo presidente do BC. Manter os juros elevados serve como um sinal de compromisso com a estabilidade e com o controle da inflação, o que ajuda a conter a desconfiança dos investidores e evitar uma fuga de capitais.

Como o Cenário Americano Pode Influenciar o Brasil

Agora, como essas decisões nos Estados Unidos podem influenciar o Brasil? O movimento do Fed de cortar os juros pode ter impactos significativos no câmbio e, por consequência, na nossa política monetária.

Quando os Estados Unidos reduzem os juros, o dólar tende a se desvalorizar globalmente, o que poderia aliviar a pressão sobre o real brasileiro. Isso porque o Brasil, oferecendo juros mais altos, se torna um destino mais atrativo para os investidores estrangeiros que buscam maiores retornos. Com mais entrada de dólares no país, a tendência é que o real se fortaleça. Um real mais forte ajuda a segurar a inflação, já que torna os produtos importados mais baratos, o que reduz os custos de insumos e commodities importadas.

Porém, se o Fed reduzir os juros e o Brasil também seguir o mesmo caminho sem antes controlar a inflação, podemos enfrentar problemas no futuro, como uma nova alta da inflação ou até uma perda de credibilidade na política econômica. O desafio para o Brasil é equilibrar essa balança: como se beneficiar de um possível alívio no câmbio sem perder de vista a necessidade de manter a inflação sob controle.

Além disso, a política monetária dos Estados Unidos afeta não só o Brasil, mas todos os mercados emergentes, influenciando os fluxos de capital. Se o Fed começa a cortar os juros, isso pode aumentar o apetite por investimentos em países como o Brasil, o que traz benefícios como maior entrada de capital e fortalecimento da moeda, mas também pode pressionar o BC a manter os juros elevados por mais tempo do que o desejado para não perder atratividade no cenário global.

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